Ricardo Alcobia (nº66546) - Papel da Audiência dos Interessados no Procedimento Administrativo
Ricardo Mateus Miguel Alcobia, aluno nº66546
Artigo 100.º Audiência dos interessados
1 - Tratando-se de regulamento que contenha disposições que afetem de modo direto e imediato direitos ou interesses legalmente protegidos dos cidadãos, o responsável pela direção do procedimento submete o projeto de regulamento por prazo razoável, mas não inferior a 30 dias, a audiência dos interessados que como tal se tenham constituído no procedimento.
2 - A audiência dos interessados pode ser escrita ou oral e processa-se, salvo quanto aos prazos, nos termos dos artigos 122.º e 123.º.
3 - O responsável pela direção do procedimento pode não proceder à audiência quando:
a) A emissão do regulamento seja urgente;
b) Seja razoavelmente de prever que a diligência possa comprometer a
execução ou a utilidade do regulamento;
c) O número de interessados seja de tal forma elevado que a audiência se torne
incompatível, devendo nesse caso proceder-se a consulta pública;
d) Os interessados já se tenham pronunciado no procedimento sobre as
questões que importam à decisão.
4 - Nas situações previstas no número anterior, a decisão final deve indicar os fundamentos da não realização da audiência.
5 - A realização da audiência suspende a contagem dos prazos do procedimento administrativo.
A audiência dos interessados proporciona aos cidadãos a oportunidade de preparar a decisão final, isto é, consiste numa forma de participação dos cidadãos na formação das decisões ou deliberações que lhes dizem respeito.
Embora, houvesse já no Código de Procedimento Administrativo de 1991 - CPA - referência a fase da audiência dos interessados, esta não consistia numa verdadeira fase do procedimento administrativo. No entanto, com o CPA de 2015 foi possível verificar uma alteração desta situação.
Nas palavras de Freitas do Amaral, a introdução desta fase consiste numa revolução da Administração Pública portuguesa e, ao mesmo tempo, "corresponde a passagem de uma Administração Pública isolada, unilateral e autoritária para uma Administração Pública participada, concertada e democrática. Pois, antes o particular não era, em regra, ouvido nem chamado a participar na formação da decisão.
Deste modo, o procedimento administrativo passa a englobar, além da fase de requerimento do particular, da fase da instrução pelos serviços e da fase da decisão pelo órgão competente, a fase de audiência dos interessados, a qual procede a fase de instrução e antecede a fase de decisão final.
Além disso, Marcelo Rebelo de Sousa define a audiência dos interessados como uma formalidade essencial, a qual é imposta pela Constituição.
Artigo 121.º Direito de audiência prévia
1 - Sem prejuízo do disposto no artigo 124.o, os interessados têm o direito de ser ouvidos no procedimento antes de ser tomada a decisão final, devendo ser informados, nomeadamente, sobre o sentido provável desta.
2 - No exercício do direito de audiência, os interessados podem pronunciar-se sobre todas as questões com interesse para a decisão, em matéria de facto e de direito, bem como requerer diligências complementares e juntar documentos.
3 - A realização da audiência suspende a contagem de prazos em todos os procedimentos administrativos.
Em conformidade com o artigo 100.º está o artigo 121.º e, de acordo com Vasco Pereira da Silva, o direito à audiência prévia é um direito conferido diretamente pela Constituição, nos termos do 267.º/4, aos cidadãos. Mas, acima de tudo, consiste num direito fundamental e caso haja violação da fase de audiência prévia, estaremos perante a violação de um direito fundamental.
Relativamente a violação do direito de audiência prévia, a doutrina diverge. Entendendo Vasco Pereira da Silva que uma decisão tomada durante o procedimento administrativo, que não respeite a fase de audiência dos interessados, é nula, nos termos do 161.º/2/d, por violação de um direito fundamental. Já Marcelo Rebelo de Sousa entende que sendo a audiência dos interessados uma formalidade essencial, o único regime aplicável é o da nulidade, nos termos do 161.º.
Já Freitas do Amaral, por sua vez, compreende que a audiência dos interessados não corresponde a um direito fundamental, cabendo neste caso o regime da anulabilidade, nos casos em que as decisões finais sejam tomadas sem que tenha havido a fase de audiência dos interessados, nos termos do 172.º. Assim, este autor argumenta que os direitos fundamentais são apenas os direitos inerentes à dignidade essencial da pessoa humana, não havendo, portando, lugar para o direito de audiência. Por outro lado, este autor argumenta também que a própria jurisprudência portuguesa define o regime aplicável como sendo o da anulabilidade.
Apesar das considerações feitas anteriormente, seguimos a mesma posição de Marcelo Rebelo de Sousa e Vasco Pereira da Silva e compreendemos que o direito a audiência dos interessados é um direito fundamental e a sua respetiva violação origina nulidade, nos termos do 161.º/2/d.
Bibliografia
Diogo Freitas do Amaral, «Curso de Direito Administrativo», volume II, 3a edição, Almedina, Coimbra.
Vasco Pereira da Silva, «Em Busca do Acto Administrativo Perdido», Almedina, Coimbra.
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