Análise do Acórdão de 2008-11-27 (Processo nº 04557/08), de 27 de novembro - Joana Jorge nº66120
Estará em análise, ao longo deste
texto, o Acórdão do Tribunal Central Administrativo do Sul de 27 de novembro de
2008, processo nº04557/08.
Este acórdão surgiu no decorrente
de uma situação no município de Oeiras em que as AA tinham uma construção que
foi encerrada com intenções de demolição nos termos do despacho proferido pelo
Presidente da Câmara de 07/03/2007, por se encontrar indevidamente não
licenciada.
Esta situação levou as AA a fazer
um pedido de declaração de ilegalidade do despacho em causa que foi negado e,
levou ao recurso a ser analisado presentemente.
As AA fundamentaram a
interposição deste recurso com o fundamento que, primeiramente o acórdão
violava o disposto nos art 69º e 70º da Constituição Republicana Portuguesa
(CRP) já que estas são menores e o encerramento desta atividade comercial
terminaria com a base do seu sustento e portanto, defendem, não se está a
assegurar a proteção de menores. Outro dos argumentos enunciados foi o de que o
princípio constitucional da igualdade (art 13º CRP) também não foi respeitado,
no sentido em que todos os proprietários dos prédios confinantes deveriam ter
sido notificados como foram as AA já que nesses prédios também existe comércio
não autorizado e as construções não licenciadas.
Do lado contrário é arguido que o
recurso deve ser rejeitado já que as autoras não conseguiram alegar qualquer
factualidade em relação à violação dos art 69º e 70 da CRP e também não ter
havido violação do art 13º da CRP porque “não existe direito à igualdade na
ilegalidade”.
O tribunal Central Administrativo
do Sul considerou, face ao primeiro argumento, que a única matéria de facto era
a de que a oficina por carecer de licenciamento ou autorização municipal foi
objeto de ordem de demolição, não existindo factos concretos, que as AA tenham
alegado ou materializado, para fundamentar uma violação dos art 69º e 70º e a
não aplicação do art 106º nº3 do DL 555/99 de 16 de Dezembro, estando o
Município de Oeiras vinculado à aplicação do disposto neste artigo, não sendo
possível arguir como fundamento à não demolição os princípios constitucionais
referidos que devem ser seguidos pelo Estado para conferir proteção aos
menores.
Em relação ao segundo argumento o
tribunal comunica a perspetiva do professor Marcello Caetano que enuncia
“existir um poder vinculado quando o seu exercício está regulado na lei. O
poder será discricionário quando o seu exercício fica entregue ao critério do
respetivo titular, deixando-lhe liberdade de escolha do procedimento a adotar
em cada caso mais ajustado à realização do interesse público protegido pela
norma que o confere”. A entidade declara que o município agiu respeitando os
poderes vinculados que obrigavam a cumprir a lei relativa a casos, como este,
de realização de obras carecidas de licenciamento. Declara também que se tem
entendido, de acordo com a jurisprudência, que quando estamos perante poderes
vinculados não há intervenção do princípio da igualdade só sendo relevante
quando há discricionariedade da administração já que “em sede da prática de
poderes vinculados impera o princípio da legalidade”, ou seja, do respeito pela
lei, não existindo igualdade na ilegalidade.
Deste modo um particular não pode
alegar um tratamento semelhante a outro se sabe que o procedimento em causa é
ilegal.
Assim, o tribunal central
administrativo do Sul declara que o “acórdão não merece qualquer reparo”,
mantendo a decisão e o recurso jurisdicional é improcedente.
Neste acórdão estão presentes
dois temas essenciais: o princípio da igualdade e o princípio da legalidade.
Analisemos primeiro o princípio
constitucional da igualdade, presente expressamente no art 13º da CRP que
determina que todos os cidadãos são iguais perante a lei, mas também em muitas
outras disposições constitucionais como o art 9º [alíneas d) e h)] que
determina que o Estado deve promover a “igualdade real entre portugueses” e
entre homens e mulheres.
Este princípio tem consagração no
direito administrativo devido ao princípio da legalidade, segundo o qual a
administração deve seguir a lei, principalmente a lei constitucional, mas
também no Código de Procedimento Administrativo (CPA) no art 5º que “a
Administração pública deve reger-se pelo princípio da igualdade” tratando todos
por igual.
Haverá então aqui uma vinculação,
em contraste com a discricionariedade da administração, ao tratamento
igualitário.
Em relação ao segundo princípio
referido, este exprime a subordinação da administração à lei, ou seja, esta tem
de, na sua atuação, respeitar as regras e princípios de direito consagrado no
ordenamento jurídico português.
O princípio da legalidade é
referido no disposto do art 266º da CRP, que determina a subordinação à
Constituição e à lei por parte dos órgãos e agentes administrativos e no art 3º
do CPA que define que estes órgãos “devem atuar em obediência à lei e ao
direito”.
O professor Vasco Pereira da
Silva considera que como a subordinação necessária não é apenas à lei em si,
deveríamos falar de um princípio da jurisdicionalidade e não da legalidade.
Neste segundo princípio temos
também uma vinculação para os poderes administrativos.
Estas vinculações à atividade
administrativa contrastam com a discricionariedade desta, ou seja, com a
liberdade de tomada de decisão que tem. É importante reter que o Professor
Vasco Pereira da Silva indica que, na verdade, todos os atos têm uma parte
vinculada e outra discricionária não existindo atos apenas discricionários ou
apenas vinculados.
Assim concluo que neste acórdão
podemos observar na prática a obediência que os órgãos administrativos têm de
ter à lei atuando em conformidade com esta, nomeadamente na decisão de
prosseguimento da demolição do edifício onde as autoras exerciam a sua atividade
comercial não licenciada, tendo sido a decisão de não aceitação de alteração da
decisão tomada em primeira instância a mais correta para o caso.
Bibliografia:
·
Diário da República Eletrónico: https://dre.pt/dre/detalhe/acordao/04557-2008-91855475
· AMARAL, Diogo Freitas do, Curso de Direito Administrativo, 4º Ed. Vol. II, Almedina, Lisboa, 2018
·
Aulas Teóricas do senhor Professor Vasco Pereira da Silva
Joana Jorge nº66120 Turma B Subturma 13
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